Com suas pequenas e tortas estrelinhas pintadas de
amarelo no fundo azul da madeira envelhecida, os dois pequenos vasos sempre com
flores frescas do quintal e os anjinhos rechonchudos já descascando, velava
toda a casa o antigo oratório do alto da cômoda onde se apoiava, protegendo com
suas frágeis paredes a pequena imagem da Vigem Maria e um crucifixo que os
antepassados, imigrantes italianos, haviam trazido de seu país.
A família, de muita fé, conservou muito bem o oratório
que os acompanhou na difícil vinda ao Brasil. Trouxeram-no em meio às roupas da
bagagem naquele navio apinhado de pessoas, e passavam os piores momentos da
viagem agarrados àquela malinha que escondia precioso tesouro.
Desde a chegada daqueles italianos, o oratório nunca
mudou de lugar, na humilde casinha de poucos móveis, sobre a cômoda onde se
guardavam as roupas, à luz do grande lampião que clareava toda a residência.
Assistiu partos, prantos, gritos de alegria.
Gerações e gerações passaram horas ajoelhadas rezando a
sua frente. E o oratório sempre lá, sempre disposto a mais um Glória ao Pai,
assim como os ouvidos de Deus que nunca se cansam de acolher as nossas preces e
pedidos de perdão.
Os respingos de cera amarela se sobrepunham no lugar onde
tantas vezes foram acesas velas em agradecimentos, novenas, festas.
Nas datas mais importantes do ano era difícil algum
horário em que ninguém estivesse dedicando alguma atenção ao oratório.
Todos os dias depois do jantar, a família toda se reunia
para rezar por mais um dia vivido.
Daquela forma, mães se tornaram avós, depois bisavós,
tataravós. Muitos fios de cabelo tornaram-se brancos.
A família modificou-se. Cresceu, trabalhou, evoluiu, mas
sua base sempre continuou a mesma, seu alicerce foi mantido, e com isso, por
mais que crescesse, sempre estaria firme.
Os novos, mesmo os que nunca tiveram contato com os
primeiros donos daquele oratório, receberam por herança a fé, e continuam a
propagá-la, não deixam que a chama se apague, que tudo se desfaleça.
Assim, mesmo com as tantas décadas já passadas, e as que
ainda prometem vir, as portas daquele oratório nunca se fecharam uma vez
sequer, nem hão de ser fechadas, pois muito mais do que suas tortas estrelinhas
amarelas e suas imagens sagradas, guarda as firmes raízes daquela família, o
amor e o cuidado de um Pai por seus filhos.
Aluã Rosa
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